Os meios de comunicação, a todo o momento, estão relatando como vários países se posicionam sobre a invasão russa à Ucrânia. Alguns países estão impondo embargos econômicos à Rússia, outros estão enviando recursos para a Ucrânia, tem aqueles que repudiam e os que justificam a guerra, por fim há os que aparentam estar neutros sobre o conflito. Nas Relações Internacionais todo movimento ou inércia sempre tem um significado, por exemplo: quando os representantes dos países saíram do auditório de reunião da Assembleia Geral da ONU, diante a fala do representante da Rússia, significa um voto de censuro, uma forma de desaprovação.
As Relações Internacionais, com sua geopolítica, geoestratégia e geoeconomia, não é algo simples de se compreender. Isso pelo fato de muito do que ocorre não ser revelado ao grande público. Mas no Brasil vemos uma tentativa de simplificação destes temas, de forma binária e maniqueísta, procurando sempre um lado bom e um ruim. Pegando essa visão simplificada, que vemos se consolidar na população brasileira, percebemos que existem dois países na América-Latina que são identificados, pela população brasileira, como aliados instantâneos da Rússia, que são Cuba, Venezuela. Veremos como estes países estão se portanto diante a invasão e quais os possíveis motivos destas atitudes.
VENEZUELA
Vamos começar a análise com nossos vizinhos venezuelanos. Nos últimos anos a Rússia e a China auxiliaram a Venezuela na tentativa de se estabilizar e se (re)inserir de forma competitiva no mercado mundial. Mas o país sofre com embargo econômico dos EUA à mais de uma década. Isso dificulta a importação e exportação do país, ao pondo de que em 2020, navios com suprimentos médicos de combate a Covid foram impedidos de atracarem em seus portos, o deixando em dificuldades junto a pandemia. Essa relação vai além, tropas russas estão em território venezuelano, para auxiliar na defesa do Estado. Por conta deste histórico há de se pensar que a Venezuela seria imediatamente defensora da Rússia, mas não foi exatamente isso que ocorreu.
Na América do Sul, somente os governos da Venezuela e do Brasil não condenaram a guerra e este é um ponto importante, pois significa que os mesmos, em um primeiro momento, não pretendem impor sanções à Rússia. No discurso da Assembleia Geral da ONU a Venezuela não reprovou o avanço militar russo, mas também não aprovou, discursando de forma a evitar o desagrado dos dois lados. Mas os discursos na ONU dizem menos que as ações posteriores. O que vemos é um país em uma situação que pode ser vista como sendo desfavorável, ou favorável, a depender de como será feita a análise.
É desfavorável pelo fato de haver uma grande dependência econômica em relação a Rússia. Ou seja, a Venezuela não pode se indispor com eles, se não sua frágil economia irá piorar consideravelmente. Assim como tem de torcer para que o país invasor não saia da guerra com uma economia muito danificada, para que possa continuar ajudando a economia venezuelana. Outro problema é em relação ao exército russo em seu território, o que faz com que Maduro evite rusgas com Putin, pois como sabemos, quem ataca um país ataca dois.
Mas nem tudo é desastre para a Venezuela, pois eles têm uma ‘carta na manga’: o petróleo. Como a Rússia e a Ucrânia são grandes produtores de petróleo e gás natural, e que naturalmente iremos ver a redução ou paralização de suas produções e exportações, seja por estar sendo atacados militarmente ou pelos embargos e sanções sofridas. E com a recusa dos países do Oriente Médio em aumentarem suas produções, o preço do barriu de petróleo e do gás natural estão aumentando de forma acelerada. O que coloca a Venezuela em um lugar de destaque nas negociações sobre energia mundial. A Venezuela é um país com grande influência na OPEP (Organização dos países exportadores de petróleo) além de ser um dos países com maior fonte de petróleo e gás natural.
Por conta desta importância estratégica da Venezuela, foi aberto um canal de comunicação histórico com os EUA, que desejam um aumento das exportações de petróleo e gás dos venezuelanos e seus aliados, como forma de controlar o preço do barril de petróleo. Uma das negociações é o fim de ao menos parte dos embargos impostos pelos EUA, certo que a Venezuela deseja o fim de todos os embargos. As negociações estão ocorrendo e parecem ser promissoras, de forma que o Maduro chegou a declarar que as bandeiras da Venezuela e dos EUA ficam lindas juntas. De forma que, essa guerra russa, pode (re)colocar a Venezuela em uma situação que possibilite o fim da crise humanitária do país, com bilhões de dólares entrando na economia e o fim dos embargos.
CUBA
Outro país latino que recebe recursos e até tropas russas é Cuba, esta ilha comunista no ‘quintal’ dos EUA é facilmente identificada com a Rússia, principalmente por conta de seu histórico na Guerra Fria. O representante cubano na Assembleia Geral da ONU fez um discurso demonstrando a hipocrisia Norte Americana e da OTAN em relação a guerra. Este discurso foi visto por alguns analistas como apoio a invasão russa, mas em nenhum momento esse apoio foi explicitado. Após este discurso o governo de Miguel Díaz-Canel se resguardou, tornando-se um observador externo ao conflito. A esperança cubana é de alguma alteração na conjuntura internacional os favoreçam de forma a conseguirem o fim dos embargos Americanos como já foi prometido pelo ex-presidente Barack Obama. Ou seja, assim como a Venezuela, eles desejam o fim dos embargos, ou que a Rússia saia fortalecida para poder ajudar ainda mais o país.
Uma guerra é algo imprevisível, principalmente quando ganha tamanha proporção quanto esta. Mas também sempre gera repercussões e alterações no campo internacional. A invasão russa à Ucrânia pode significar uma mudança radical na configuração geopolítica mundial. Por isso sempre há possibilidades de ganhos e perdas, a pergunta que só conseguiremos responder ao final da guerra é: “Quem ganhou com a guerra?”.
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- Por Paulo Henrique Borges da Rocha
Pós-Doutorando pela UFOP - Legendas: Redação