A rainha do chilique e a falta de políticas culturais em tempos de pandemia

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Por Éverlan Stutz*

A classe artística ficou estarrecida com a desastrosa entrevista da secretária especial de cultura, Regina Duarte, concedida à CNN Brasil na última quinta-feira. A rainha da suástica não quis nem ouvir Maitê Proença e questionou: “O que vocês ganham ao desenterrar uma fala de dois meses atrás?” A Viúva Porcina ignorou totalmente o apelo de Dona Beija. Não ouviu nem escutou.  Deu um chilique! A incapacidade de ouvir críticas é uma característica patológica de pessoas autoritárias que não toleram o confronto de ideias, o debate. A incomunicabilidade é a base desse desgoverno. O atual presidente mandou um jornalista calar a boca. E isso motivou protestos de vários órgãos que defendem a liberdade de imprensa. No comando da pasta da cultura, Regina Duarte demonstrou que não está aberta ao diálogo e revelou a falta de políticas públicas para o setor. A categoria está entre os profissionais mais atingidos pelas medidas de distanciamento social que foram adotadas para conter o avanço da pandemia. O fechamento de bares e restaurantes e a proibição de eventos públicos tiram o sustento de cantores, produtores, dançarinos, músicos e de muitos profissionais que dependem do fazer artístico como fonte de renda.

Regina Duarte sempre seguiu os princípios da propagação do cinismo e da intolerância de quem não representa seu grupo seleto de amizades. Esse grupinho aristocrático desconsidera que a garantia de direitos culturais é uma construção social e histórica de artistas, políticos e intelectuais que lutaram bastante para legitimar essas conquistas, como Fernanda Montenegro, José Aparecido de Oliveira, Celso Furtado, Ângela Gutierrez e Gilberto Gil.  Nossa elite escrota sempre marginalizou os movimentos sociais e culturais. Na campanha eleitoral, que elegeu o primeiro presidente operário deste país, Regina fez um apelo dramático e canastrão para demonizar a eleição de Lula. Falem o que quiserem, mas foram as mãos do presidente desprovido de um dedo que mais trabalhou para o povo que vive na linha da miséria. Lula é um líder internacional e, mesmo diante das arbitrariedades de sua prisão, continua vivo na memória social dos menos favorecidos. Já Regina Duarte enterrou sua carreira para apoiar um desgoverno que aniquilou o Ministério da Cultura, que colocou um negro racista para presidir a Fundação Palmares, que  cortou mais de 40% dos recursos destinados à Agência Nacional de Cinema (Ancine), que promove o desmonte do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

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A situação da classe artística é tenebrosa e Regina Duarte bufou arrogância na cara de todos os artistas que estão passando por muitas privações devido à pandemia. Durante a entrevista, ela teve a cara de pau de esbravejar: “eu tinha tanta coisa bacana pra falar”. Não há nada “bacana” neste desgoverno. E é bom avisar para Regina que ela não está atuando em uma telenovela. A falta de noção da secretária especial de cultura chegou ao ponto de reclamar: “não foi combinado nada disso”, como se a imprensa tivesse que agir com roteiros prontos para ela ler suas listinhas tresloucadas enquanto milhões de artistas não têm o que comer em suas casas. Mas o que esperar de uma artista que foi consagrada como “namoradinha do Brasil” em épocas de chumbo e tortura? Filha de pai militar, Regina recebe uma pensão desde 1999. Ela mama nas tetas da república há décadas e ainda tem a ousadia de debochar e minimizar as mortes causadas pela ditadura militar e também por Covid-19.  É um absurdo esse negacionismo da realidade social e muita falta de humanidade de uma gestora pública que age como se estivesse interpretando mais uma personagem melodramática, mais uma protagonista sofrida e injustiçada.  A mocinha virou vilã na vida real. Quem é Odete Roitmam na fila da vileza?   

A rainha do chilique zombou, com sua interpretação histriônica, das mazelas que o atual desgoverno causou e tem causado aos artistas brasileiros que lutam para sobreviver como malabaristas e equilibristas diante de um circo de horrores. Um desgoverno que faz ataques constantes contra a ciência, as universidades públicas, a imprensa e a gestão de políticas culturais acessíveis, democráticas e participativas. Vários artistas reagiram contra as sandices da rainha do chilique. No entanto, a classe artística não pode e nem deve ficar na reação instantânea e passional frente ao desrespeito de direitos assegurados pela Constituição Federal de 1988. É necessário uma ação efetiva de produtores culturais, cineastas, músicos, políticos, intelectuais e juristas para garantir a sobrevivência dos artistas de rua, dos grupos que representam a cultura popular, dos artesãos, dos operários circenses  e da grande maioria de artistas anônimos que estão sem representatividade alguma neste desgoverno que se mostra totalmente fechado ao diálogo e sem uma política pública de cultura voltada para geração de renda de milhões de brasileiros que estão impossibilitados de trabalhar.

(*)Éverlan Stutz é jornalista formado pelo Centro Universitário de Belo Horizonte, bacharel em Artes Cênicas pela Universidade Federal de Ouro Preto, Pós-graduado em Gestão do Patrimônio Cultural pela PUC Minas.  

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