Início Cidades Ação mira bancos nos EUA que financiaram barragens de risco da Vale

Ação mira bancos nos EUA que financiaram barragens de risco da Vale

Ouro Preto, Barão de Cocais, Itabira, Itabirito, Mariana, Nova Lima e São Gonçalo do Rio Abaixo são partes no processo.

O processo começou a tramitar em setembro no Tribunal Distrital dos Estados Unidos para o Distrito Sul de Nova York. Ele é movido pela Prefeitura de Ouro Preto e municípios mineradores do quadrilátero ferrífero. Na imagem, distrito de Bento Rodrigues, em Mariana. atingido pelo rompimento da barragem de Fundão. Foto: Antônio Cruz/Abr

A prefeitura de Ouro Preto deu entrada nos Estados Unidos em uma ação judicial, em seu nome e em nome de outros seis municípios mineiros.
Os alvos são os bancos Merril Lynch, Barclays Capital, Citibank e JP Morgan.
Eles são apontados como financiadores de empreendimentos de risco da Vale.

A mineradora está envolvida nas tragédias ocorridas em Brumadinho no dia 25 de janeiro de 2019, e em Mariana no dia 5 de novembro de 2015.
Foi anexado um levantamento que aponta para empréstimos realizados desde 2011, somando um total de US$ 17,2 bilhões.

A tragédia de Mariana completa oito anos neste domingo.

Lucros na mineração

As instituições financeiras são acusadas de lucrarem com as operações da mineradora e não se preocuparem com os prejuízos causados às comunidades.
“A Vale não tinha recursos financeiros para perpetuar sua estratégia sistêmica de dizimação do meio ambiente dentro dos limites municipais”, diz a ação.
Os bancos são também apontados como investidores importantes da mineradora.
Dessa forma, estariam lucrando com os juros dos empréstimos e também com o aumento do valor das ações da Vale.

Distrito de Bento Rodrigues em Mariana sumiu do mapa após o rompimento da Barragem de Fundão em 5 de novembro de 2015


Além disso, os financiamentos teriam se mantido e até aumentado mesmo após as tragédias ocorridas.

O processo começou a tramitar em setembro no Tribunal Distrital dos Estados Unidos para o Distrito Sul de Nova York.
A Agência Brasil teve acesso em primeira mão ao pleito apresentado.

Outros municípios da região


Representada pelo escritório Milberg, a prefeitura de Ouro Preto informa ao juízo que fala também em nome das prefeituras de Barão de Cocais, Itabira, Itabirito, Mariana, Nova Lima e São Gonçalo do Rio Abaixo.

A ação narra que, nos últimos anos, barragens inseguras foram paralisadas e populações que moram no entorno passaram a conviver com sirenes avisando dos riscos de rompimento, sendo que algumas comunidades foram evacuadas.

Prejuízos


São listadas consequências econômicas dessa situação: ônus adicionais aos municípios no apoio aos atingidos, desvalorização de propriedades.

Além disso, houve aumento dos gastos com saúde, segurança pública e outros serviços sociais.

“Os municípios estão enfrentando uma perda tangível de receita. A receita do imposto sobre vendas, uma parte significativa de sua força financeira, diminuiu à medida que a economia local desmorona”, acrescenta a ação.

São mencionados ainda danos ao patrimônio físico e cultural, danos ao meio ambiente e à qualidade de vida e danos suportados pelos moradores.
O município de Ouro Preto afirma que a pressão sobre a população gera um custo físico, financeiro e emocional.

“A ameaça de rompimento de barragens, evacuações frequentes e fechamento de estradas afetaram a sua capacidade de sustento, causando perdas de rendimento significativas”.

Legislação

A ação pede que o tribunal leve em conta a legislação brasileira, mais especificamente a Lei Federal 6.938/1981, conhecida como Lei Nacional de Política Ambiental.
Ao mesmo tempo, defende que Nova York é o foro apropriado para discutir a questão, tendo em vista que os bancos não se submetem à jurisdição brasileira e que as evidências dos empréstimos se encontram na metrópole dos Estados Unidos.

As cidades citadas na ação estão situadas no chamado Quadrilátero Ferrífero, que concentrou o maior número de episódios de evacuação.
Elas foram resultado de um pente-fino realizado por órgãos de fiscalização após a tragédia ocorrida em Brumadinho, na qual 270 pessoas perderam suas vidas na avalanche de rejeitos liberada no colapso de uma estrutura da Vale.

Na época, também foram aprovadas legislações proibindo a existência de barragens erguidas por alteamento a montante.

Bombeiros de Minas Gerais nos primeiros dias de trabalho após rompimento de estrutura da Vale em Brumadinho em 2019


Esse método está associado tanto à tragédia em Brumadinho, quanto ao desastre ocorrido em Mariana com a ruptura da estrutura da Samarco, mineradora que tem como acionistas a Vale e a BHP Billiton.
No episódio, 19 pessoas perderam a vida e populações de dezenas de cidades da bacia do Rio Doce foram impactadas.
A eliminação das barragens alteadas a montante se tornou obrigatória.

A Vale, assim como a maioria das mineradoras, ainda não cumpriu integralmente a legislação, o que a levou a assinar um termo para pagar R$ 251 milhões.

Corresponsabilidade


Segundo a prefeitura de Ouro Preto, os empréstimos a empreendimentos da Vale desde 2011 geraram degradação no Quadrilátero Ferrífero e os bancos são corresponsáveis pelos danos causados.
Ela cita 21 barragens da Vale classificadas como de alto risco associado, o que significa que armazenam grandes volumes de rejeitos e possuem comunidades com atividades socioeconômicas no entorno.

Ameaça de rompimento da Barragem Cava Sul, na localidade de Gongo Soco, em Barão de Cocais, provocou um drama coletivo na cidade e centenas de evacuações. Situação se repetiu em Itabirito, Ouro Preto, Nova Lima, São Gonçalo do Rio Abaixo e Itabira.

Também aponta que algumas dessas estruturas não são certificadas como estáveis ou já geraram em algum momento preocupações relacionadas à estabilidade.

De acordo com a prefeitura de Ouro Preto, os bancos não podem alegar que não sabiam dos riscos dos empreendimentos e tinham poder para forçar uma mudança de comportamento na Vale, mas nada fizeram e continuaram realizando empréstimos de forma incondicional.
A ação aponta ainda violação dos Princípios do Equador, criado em 2002 pela Corporação Financeira Internacional (IFC).
Eles estabelecem diretrizes para que as instituições financeiras tomem decisões responsáveis a partir da identificação e avaliação dos riscos ambientais e sociais dos projetos a serem apoiados.
“Os réus usaram uma fachada de adesão aos Princípios do Equador para criar uma imagem conscientemente falsa para seus investidores nos Estados Unidos”, registra a ação.

Respostas

Procurados pela Agência Brasil, os bancos Merril Lynch, Barclays Capital e JP Morgan não se pronunciaram.

O Citibank retornou o contato e afirmou que “não fará comentários”. A Vale informou desconhecer a ação.
*Com informações da Agência Brasil
Foto: Tãnia Rego /Abr/CBMMG/Rogério Alves/Agência Senado/Vale

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