O rompimento da barragem da Vale em Brumadinho que matou 272 pessoas continua sem reparação dois anos depois. A mineradora se recusa a pagar a indenização estipulada pelo governo de Minas Gerais. Na última quinta-feira (21), mais uma audiência sobre o principal acordo de reparação terminou sem consenso. A contraproposta apresentada pela Vale não foi divulgada.
A indenização pedida inicialmente pelo Ministério Público de Minas Gerais foi de R$ 54 bilhões, dos quais R$ 28 bilhões seriam destinados a cobrir danos morais sociais e coletivos. Os R$ 26 bilhões restantes se destinam às perdas econômicas do estado, calculadas pela fundação estatal João Pinheiro. Os valores foram estimados com base no lucro líquido da mineradora no trimestre anterior ao estudo. Caso fosse feito hoje, o montante seria ainda maior.
“O impacto da morte de 272 pessoas e toda a comoção que isso gerou requer uma punição exemplar para que a empresa não permita que isso ocorra novamente”, disse à Brasil de Fato José Geraldo Martins, da coordenação estadual do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).
Interferência da Vale
Martins disse ainda que a reparação integral não pode ser baseada nos estudos pagos, promovidos ou realizados por empresas contratadas pela Vale, como está ocorrendo. “O telefone de contato que eles distribuem para os atingidos, para dúvidas e reclamações, é o 0800 da própria Vale. É uma situação surreal: a criminosa vai definir o que foi o estrago e o que ela está disposta a pagar para corrigir. A empresa criminosa é tratada como parceira. Isso é inaceitável.”
Há a suspeita de que a Vale tenha interferido na Justiça mineira para forçar um acordo que atenda apenas aos seus interesses. Na semana passada, as vítimas do crime em Brumadinho, que desde o início têm sido excluídos das audiências sobre o acordo, foram surpreendidos com mudanças no Tribunal de Justiça de Minas. O processo que era analisado na primeira instância, na 2ª Vara da Fazenda Pública e Autarquias da Comarca de Belo Horizonte, foi parar no Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC), na segunda instância.
O MAB avalia que houve interferência para tirar do processo o juiz Elton Pupo Nogueira, responsável pela primeira condenação da Vale em 2019 e que acompanhava de perto toda a questão envolvendo o rompimento da barragem e seus impactos sobre a população e o meio ambiente de Brumadinho.
Auxílio emergencial
“Tanto que houve vários avanços naquele tribunal, como o auxílio emergencial para boa parte da população, o cadastro dos atingidos ser feito de forma coletiva pelas comissões de atingidos, homologou o início do trabalho das assessorias técnicas e nomeou a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) como perita, para contrapor aos estudos que a Vale vem fazendo . Tudo isso foi conquistado na primeira instância”, disse o coordenador do MAB.
Já na segunda, a participação dos atingidos foi negada até mesmo como ouvintes. O movimento reivindica que a revisão do pagamento dos R$ 28 bilhões, pleiteados na ação civil pública por danos morais coletivos, seja decidido com participação dos moradores da bacia do Rio Paraopeba, que foram os maiores atingidos.
“A Vale reconhece, desde o dia do rompimento, sua responsabilidade pela reparação integral dos danos causados”, afirma a empresa em nota. “Até o momento foram pagas cerca de 8.700 indenizações individuais. (…) A Vale continuará a cumprir integralmente sua obrigação de reparar e indenizar as pessoas, bem como de promover a reparação do meio ambiente, independentemente de haver condenação ou acordo. Até o momento, a empresa destinou cerca de R$10 bilhões para estes fins.”
Por Cida de Oliveira/RBA