Em depoimento realizado ontem (27) à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) que investiga possíveis irregularidades na gestão da Cemig, Carlos Eduardo Altona, sócio da consultoria Exec, confirmou a participação ativa do empresário Evandro Negrão de Lima, do diretório do Partido Novo, no processo de seleção do atual presidente da estatal, Reynaldo Passanezi Filho.
A ligação entre a headhunter Exec e o Novo, a legitimidade de um dirigente partidário para negociar em nome da Cemig e do governo, e a validação posterior de serviços já executados (convalidação) para suprimir mecanismos de controle pautaram os questionamentos dos parlamentares durante a reunião.
Questionado pelo relator da CPI, deputado Sávio Souza Cruz (MDB), Carlos Eduardo Altona informou que o principal contato da empresa na negociação com a Cemig era Evandro Negrão de Lima, que, apesar de não possuir qualquer vínculo com a companhia ou o Executivo estadual, era tratado como interlocutor do governo.
Foi o dirigente do Novo quem procurou a Exec para o serviço e a quem a primeira proposta da empresa, em novembro de 2019, foi dirigida. Ela foi rejeitada justamente por esse motivo, e um novo documento foi encaminhado à Cemig em janeiro, que resultou na regularização do contrato com a Exec em fevereiro de 2020, mais de 30 dias depois de Reynaldo Passanezi ter sido nomeado para o cargo.
O sócio da Exec também relatou que Evandro Negrão de Lima negociou valores e outros termos do contrato, bem como participou da definição do perfil para o cargo e de entrevistas com os candidatos que chegaram ao último estágio de avaliação. O alto comando da Cemig estaria a par da situação, ponderou o depoente.
Evandro Negrão de Lima também foi o intermediador de um contrato da Exec com o Partido Novo em Minas Gerais para a seleção de secretários de Estado, em novembro de 2018. Carlos Eduardo Altona é filiado ao partido, assim como alguns de seus sócios, entre os quais Rodrigo Forte, que foi quem conduziu, por parte da empresa, a escolha do presidente da Cemig. A Exec recebeu pelo trabalho, em um processo sem concorrência, R$ 170 mil.
A Exec também já atuou para o partido, entre 2018 e 2019, para a validação de candidatos ao seu diretório nacional e aos cargos de prefeito e vice-prefeito de capitais. Na Cemig, também participou da escolha de três diretores em fevereiro de 2020, ao custo de R$ 129 mil, sendo um deles o diretor jurídico, Eduardo Soares, personagem central em um suposto esquema de contratações sem licitação na empresa.
“Chama a atenção a relação de uma empresa desse porte com uma pessoa sem procuração da Cemig. A Exec nem se deu ao trabalho de pesquisar se essa pessoa tinha autoridade para falar em nome da presidência, isso é gravíssimo”, afirmou o vice-presidente da CPI, deputado Professor Cleiton (PSB). “Dirigente partidário não negocia contrato no setor público, não faz interlocução em nome do governador. A ingerência está comprovada”, complementou a deputada Beatriz Cerqueira (PT).
Deputados cobram detalhes de contratos
Atendendo solicitação dos membros da CPI, o sócio da Exec explicou as especifidades de cada um dos dois contratos da empresa com a Cemig. No primeiro, para escolha do presidente da companhia, foi feito um detalhamento do perfil almejado, um mapeamento de mercado de nomes potenciais e entrevistas com candidatos. De uma primeira lista de 40 nomes, quatro foram selecionados para uma avaliação final, por parte da estatal.
Já no processo que envolvia a escolha de diretores, a própria Cemig apresentou 13 nomes, posteriormente analisados pela consultoria, que emitiu pareceres sobre as indicações.
Sávio Souza Cruz perguntou se não causou estranheza o escolhido para a presidência, Reynaldo Passanezi Filho, ter processado o pagamento da empresa que o indicou, ao que o depoente respondeu que não. Indagado pelo presidente da CPI, deputado Cássio Soares (PSD), se havia alguma garantia quando o serviço foi iniciado, já que não havia contrato assinado, o empresário afirmou ser essa uma prática comum em situações que envolvem urgência e sigilo.
Professor Cleiton questionou a comprovação da cobrança de valores de mercado pela Exec, tendo em vista que, contrariando a Lei das Estatais, ela teria apresentado apenas uma carta-proposta com diferentes valores cobrados por outras empresas.
Na mesma linha, Beatriz Cerqueira lembrou que, em seu depoimento, o sócio da Exec explicou que o valor inicialmente pedido pela seleção do presidente estava relacionado a uma porcentagem do salário pago para o cargo mais um bônus de oito salários, o que daria R$ 425 mil. A deputada quis saber por que, então, foi aceito o valor fixo de R$ 170 mil.
Carlos Eduardo Altona disse que, informado de que outras consultorias haviam sido consultadas pela estatal de energia, a Exec decidiu reduzir seus honorários, pelo interesse de trabalhar para uma empresa como a Cemig.
Nesse ponto, Sávio Souza Cruz criticou a conduta do Partido Novo, classificado como liberal, de fornecer informações sobre propostas de outros concorrentes, o que indicaria o interesse pela escolha da Exec. Para Professor Cleiton, a inexigibilidade de licitação e a convalidação do contrato foram instrumentos para dar um aspecto de legalidade ao processo. Também para Beatriz Cerqueira, a população pagou por uma indicação política do Novo e do governador Romeu Zema.
Prática usual
Por outro lado, os deputado Roberto Andrade (Avante) e Zé Guilherme (PP) defenderam os procedimentos adotados pela Cemig. O primeiro destacou que o sigilo é realmente necessário na seleção do presidente de uma empresa como a Cemig, que possui ações listadas em bolsa, o que justificaria a posterior convalidação.
Ele também elogiou a inciativa pioneira do Governo de Minas de contratar consultorias para recrutar secretários e executivos e ressaltou a expertise da Exec nesse serviço. Sobre a suspeita de que tudo não passaria de fachada para a escolha de nomes pré-definidos, ele argumentou que a empresa não se daria ao papel de simular interesse em 40 nomes e criar expectativas em profissionais do mercado de trabalhar na Cemig.
Para Zé Guilherme, é normal os partidos que compõem as coligações vencedoras fazerem indicações, cabendo ao governo aceitá-las ou não.
Altona será ouvido novamente pela CPI
Ao final da reunião, a CPI aprovou requerimento para que Carlos Eduardo Altona forneça à comissão, no prazo de 48 horas, todas as informações que ele se comprometeu a apurar internamente após questionamentos feitos pelos deputados na reunião. Também foi aprovado requerimento para que ele retorne à comissão, na condição de testemunha, para prestar informações sobre os fatos que não foi capaz de esclarecer.
Outro requerimento aprovado é para que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) informe se os sócios da Exec fizeram doações a partidos políticos ou candidatos nas duas últimas eleições.
A Cemig também deverá encaminhar documentos relacionados à pesquisa prévia para contratação da empresa responsável pela seleção do atual presidente da companhia, com nomes das empresas consultadas e valores estipulados para a execução do serviço, e esclarecer por que o contrato com a Exec datado de maio de 2021 só foi assinado por Rodrigo Forte em agosto.
Quebra de sigilo
Ainda foi aprovado requerimento para a quebra dos sigilos bancário, telefônico e telemático do diretor de Regulação e Jurídico da Cemig, Eduardo Soares. A CPI constatou que ele emitiu pareceres para a contratação direta de empresas e escritórios de advocacia. Um desses contratos é com o escritório Lefosse, do qual ele foi sócio antes de assumir o cargo de diretor na Cemig, no valor de R$ 890 mil. Esse conflito de interesses pode configurar crime contra a administração pública.
*Com informações da ALMG.
Foto: Daniel Protzner