Impactos ambientais e sociais persistem no Vale do Rio Doce

Informação sobre pequeno volume de rejeito retirado no lago da Usina de Candonga surpreendeu público e autoridades

Comissão constata que, sete anos após o rompimento de barragem em Mariana, rejeitos ainda poluem as águas, e moradores aguardam reparação.
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Apenas cerca de cinco por cento dos rejeitos que desembocaram no lago da Usina Hidrelétrica Risoleta Neves, conhecida como Candonga, no município de Rio Doce, foram retirados pela Samarco, após sete anos do rompimento da barragem de Mariana, em 2015.

A informação foi divulgada, nesta sexta-feira (5), em visita da Comissão Extraordinária de Acompanhamento do Acordo de Mariana, instituída este ano pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), ao local que é de propriedade da Vale e da Aliança Energia.

De acordo com o gerente do Consórcio Candonga, Roberto Schaefr, dos cerca de 10 milhões de metros cúbicos de rejeitos que foram levados a esse trecho do Rio Doce, em decorrência do rompimento, aproximadamente 570 mil metros cúbicos foram retirados pela mineradora em 2022, permitindo que a hidrelétrica voltasse a operar em fase de testes neste ano.

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O gerente contou ainda que foram retirados os rejeitos que ficavam próximos às tomadas de água. Agora é necessário um monitoramento constante para verificar como todo o rejeito restante se comporta, pois, dependendo das condições, pode haver nova interrupção no funcionamento da usina.

Antes disso, em 2016, conforme contou, foram feitas algumas dragagens emergenciais. Apesar dessas iniciativas, tanto o gerente do consórcio quanto o prefeito de Rio Doce, Mauro Pereira Martins, enfatizaram que não tiveram um retorno da Samarco com um planejamento para continuar a retirar os rejeitos do lago da usina.

A deputada Bella Gonçalves (Psol) demonstrou preocupação com a situação. Conforme disse, uma pequena parte dos rejeitos foi tirada para que a usina voltasse a funcionar. “Foi retirado o rejeito para gerar lucro e não por uma preocupação social e ambiental, já que a maior parte continua lá”, falou.

Ela perguntou ao gerente do consórcio se há monitoramento da qualidade da água na usina, ao que ele respondeu que são feitas análises, mas que não tinha as informações para apresentar naquele momento.

O procurador da República Carlos Bruno Ferreira da Silva disse que se surpreendeu com a baixa quantidade de rejeitos retirados e afirmou que o risco ambiental é grande.

Comunidade relata impactos sociais


Enquanto os problemas ambientais não são reparados, os impactos sociais decorrentes do rompimento da barragem também se agravam nos municípios afetados. É o que relatam representantes comunitários.

Segundo o morador de Rio Doce Leandro Gonzaga, a comunidade está com a saúde debilitada depois do rompimento da estrutura em função dos diversos problemas que enfrentam.

Durante um encontro com pessoas atingidas, em uma área onde foram depositados rejeitos retirados da usina, ele contou que os moradores não podem mais usar o rio para tirar seu sustento, pescando, minerando ou tirando areia, nem pra se alimentar dos peixes e para o lazer.

Em suas considerações, o morador afirmou que “depois que a barragem se rompeu, ela matou o rio e a gente também, porque a gente sempre viveu aqui e desse rio.”

Leandro Gonzaga criticou a Fundação Renova, que foi criada para fazer a reparação após o rompimento. Em sua opinião, a fundação não reparou devidamente os atingidos e não tem critérios em relação a quem vai receber as indenizações e quais os valores.

Deputados também visitaram Santa Cruz do Escalvado (Zona da Mata) e Barra Longa (Rio Doce).
A representante da Comissão dos Atingidos desse município, Silvana Arlindo de Pinto, relatou que de cerca de 5 mil moradores atingidos de Nova Soberbo, comunidade dessa cidade, 60% não receberam indenização.

Ela contou que eles são duplamente atingidos. Isso porque, inicialmente, foram tirados de suas casas, em 2002, para a construção da usina e deslocados para essa comunidade.
Depois, pelo rompimento da barragem, que tirou o sustento das famílias que dependiam do rio.

Silvana Arlindo disse que perdeu o pai sem que ele tivesse recebido a indenização. Agora, sua mãe de 81 anos aguarda o ressarcimento.

O deputado Leleco Pimentel (PT) destacou que os crimes estão se perpetuando na região. Ele disse que é preciso reverter o mais rápido possível esse quadro.

Em Barra Longa, continuaram os relatos sobre a falta de uma reparação justa aos atingidos. O deputado federal Rogério Correia (PT-MG) comentou que há denúncias de que moradores vão receber as indenizações, algumas no valor de R$ 12 mil, e terão apenas três meses para construir suas casas, prazo em que a Samarco vai parar de pagar os alugueis para os atingidos. “Quem vai reformar ou construir com R$ 12 mil?”, perguntou.

Comissão continua com atividades nesta sexta (5)


A Comissão Extraordinária de Acompanhamento do Acordo de Mariana continua suas atividades nesta sexta (5) com uma audiência à noite em Antônio Pereira, distrito de Ouro Preto.

O presidente da comissão, deputado Ulysses Gomes (PT), explicou que o objetivo da comissão é percorrer os locais afetados ao longo do Rio Doce para colher informações que possam subsidiar a construção de uma nova repactuação para os atingidos.

Para criar a comissão extraordinária, a Mesa da Assembleia considerou os atrasos e o descumprimento de cláusulas de acordo de reparação celebrado em 2016 pela União, pelo Estado de Minas Gerais, pelo Estado do Espírito Santo e pelas empresas Samarco, BHP Billiton e Vale.

Considerou, ainda, as notícias de negociações em torno de um novo acordo, se comprometendo por meio da comissão a acompanhar seus desdobramentos e o efetivo cumprimento das reparações.

Também participam das atividades as deputadas Beatriz Cerqueira e Macaé Evaristo, ambas do PT, e o deputado federal Padre João (PT-MG).

As visitas foram acompanhadas ainda por representantes da Advocacia-Geral da União, da Secretaria-Geral da Presidência da República e do Ministério do Desenvolvimento Social.

Rompimento


A avalanche de rejeitos, em 2015, matou 19 pessoas e deixou um rastro de destruição ao longo do Rio Doce, o que afetou diretamente agricultores, pescadores, comunidades rurais e indígenas da região.

*Com informações da ALMG

Foto: Willian Dias

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