Justiça garante auxílio emergencial mensal às 492 pessoas evacuadas pela Vale em Barão de Cocais

Vale teve a cara de pau de argumentar que auxílio aos moradores é assistencialismo e defendeu que município e estado "cobrissem" as despesas.
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Em petição conjunta, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), a Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) e o Ministério Público Federal (MPF) obtiveram da Justiça de Barão de Cocais decisão determinando à Vale que pague, por mais um ano, às pessoas que se encontram desalojados de suas residências, um salário mínimo a cada adulto, meio salário mínimo a cada adolescente e um quarto de salário mínimo a cada criança. Deverá ser pago também, para cada família, o valor correspondente a uma cesta básica estabelecido pelo Dieese.

Terão direito ao pagamento 492 pessoas evacuadas em março de 2019, devido aos riscos de inundação do complexo minerário Gongo Soco.

O MPMG, MPF e DP ressaltam na Ação Civil de Tutela Cautelar Antecedente que grande parte dos atingidos não tiveram suas atividades econômicas originais restabelecidas e foram profundamente abalados em seu modo de viver, inclusive passando a ser obrigados a comprar os alimentos que antes plantavam e consumiam.

Em depoimentos reproduzidos na Ação Cautelar, pessoas atingidas de forma abrupta pelo desastre ambiental relatam suas perdas monetárias e sociais e questões emocionais, como a vontade de voltar para casa. “Entretanto, fica evidente a preocupação da ré com a repercussão de suas ações para o mercado financeiro e não para a vida das pessoas”.

O MPMG, MPF e DP argumentam ser inviável simplesmente extinguir o valor pago como auxílio financeiro emergencial sem que os moradores tenham retomado suas condições de sobrevivência anteriores ao desastre. “A assistência financeira não é favor ou liberalidade da empresa, mas sim direito do atingido e obrigação da mineradora, como corolário do princípio da reparação integral do dano ambiental, acolhido pela Constituição Federal”.

“A Constituição Federal prevê que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores – pessoas físicas ou jurídicas, às sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”, enfatizam os autores da Ação Cautelar.

O pagamento do auxílio emergencial decorre também da aplicação do princípio da precaução e do princípio do poluidor pagador, os quais estabelecem que o poluidor tem a obrigação de recuperar e/ou indenizar danos causados, inclusive a de arcar com todos os custos decorrentes da poluição.

População cocaiense viveu meses de terror e de abandono. Cidade ficou deserta e população desamparada por longo período. Prefeito implorou de joelhos visita de Romeu Zema. Foto: Mundo dos Inconfidentes.

O MPMG, MPF e DP argumentam ainda que o pagamento é devido não só àqueles que residiam na zona de autossalvamento, mas também aos cidadãos que foram deslocados de suas casas, afastados de suas atividades profissionais e prejudicadas pelo evento, já que os danos sociais não “respeitam” rigidamente as linhas imaginárias da zona de autossalvamento (ZAS) e da zona de salvamento secundário (ZSS).

Assinam a Ação Cautelar as promotoras de Justiça Clarisse Perez do Nascimento Nascif Mendes, da comarca de Barão de Cocais, e Hosana Regina Andrade de Freitas, da Bacia do Rio Doce; a defensora pública Carolina Morishita Mota Ferreira; e os procuradores da República Helder Magno da Silva e Edmundo Antonio Dias Netto Junior.

Decisão
Na decisão, que definiu a forma de pagamento do auxílio emergencial, a Justiça determinou que terão direito ao pagamento os proprietários, possuidores, locatários ou ocupantes de edificações nas Zonas de Autossalvamento e de Salvamento Secundário da barragem que se encontra em situação de rompimento iminente.

Segundo o juiz Luís Henrique Guimarães de Oliveira, após esse período adicional de um ano, será possível fazer nova reavaliação dos fatos e da situação dessas pessoas pelas partes e pelo Juízo.

Na decisão, o juiz destaca que a Vale encontra-se posicionada como uma das maiores empresas mineradoras do mundo e como uma das cinco maiores empresas brasileiras, com valor de mercado de R$ 58 bilhões.

Destaca também que, há 20 anos, a Vale apresentou receita líquida de R$ 9,5 bilhões e lucro líquido de R$ 2,1 bilhões, e que agora, em 2020, seus balanços trouxeram receita líquida de R$ 153 bilhões e lucro líquido de R$ 23 bilhões, demonstrando a expansão das atividades e das operações da empresa.

O juiz determinou também que o teor da decisão seja levado ao conhecimento dos acionistas da Vale S/A e do mercado através da divulgação de fato relevante, com demonstração nos autos no prazo de 20 dias.

Nos argumentos, Vale diz que ajuda é assistencialismo

Apesar dos bilhões de lucros obtidos após as tragédias de Mariana e Brumadinho, Vale diz que auxílio para os moradores de Barão de Cocais era assistencialismo. Justiça definiu que argumento é ruim.


Após extensa exposição defendendo a extinção do pagamento emergencial, a Vale argumentou que concordaria em prorrogar o pagamento por seis meses além do acordado na audiência de novembro de 2019, declarando estar “confiante em que esse Juízo afastará, integralmente, as pretensões formuladas pelos autores”.

Entre outros argumentos, seus representantes defenderam que o pagamento emergencial pactuado pelas partes deveria ser encerrado, uma vez que já extrapolado o prazo acordado”; e “porque a obrigação da Vale, neste momento, iria além da noção de reparação, alcançando o assistencialismo que cabe ao Governo prover e, ainda, que, a obrigação da companhia, já objeto de decisão transitada em julgado, é de natureza reparatória, não assistencialista”.

Fonte: MPMG

Legendas das fotos: Redação

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