A borda de um abismo de 200 metros de profundidade, que separa os domínios da mineração e da conservação ambiental na Serra da Moeda, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), foi o local escolhido para visita de parlamentares da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta segunda-feira (16).
Ainda que já existisse antes, o precipício foi ampliado pela ação da mineradora Gerdau, que hoje opera a mina Várzea do Lopes.
Agora é uma cava profunda que ocupa uma ampla área entre a BR-040 e a Serra da Moeda.
A Gerdau explora minério de ferro na vertente da Serra da Moeda voltada para leste, no município de Itabirito.
Já a vertente oeste, no município de Moeda, permanece dentro dos limites de preservação.
À beira do abismo, integrantes da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da ALMG mostraram divergências a respeito do Projeto de Lei (PL) 1.185/23, de autoria do deputado Noraldino Júnior (PSB).
O projeto altera os limites do Monumento Natural Estadual Serra da Moeda (Mona).
Explicações
Aos representantes de entidades ambientalistas que participaram da visita, o autor do projeto explicou que sua intenção é apenas ampliar a área do monumento natural acrescentando áreas indicadas pela Gerdau.
“Diferente de outros projetos anteriores, esse só traz a anexação de áreas, não há desafetação alguma”, afirmou Noraldino Júnior.
Desafetação é o nome técnico para a mudança legal de finalidade de uma área.
No caso, a desafetação poderia liberar um terreno, antes preservado, para a mineração.
Posição de Parlamentares
Autoras do pedido para realização da visita à Serra da Moeda, as deputadas Beatriz Cerqueira (PT) e Bella Gonçalves (Psol) criticaram o projeto.
Elas consideram que ele é uma oportunidade para que o lobby das mineradoras pressione para a apresentação de emendas que prejudiquem e reduzam a área preservada atualmente.
“Não é possível controlar a tramitação do projeto. Qual o objetivo de acrescentar algo (ao Monumento) que ninguém está pedindo? Se a intenção é a preservação, porque não trabalhar para aprovar a PEC?”, questionou a deputada Beatriz Cerqueira, referindo-se à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 7/23, que promove o tombamento das Serras do Rola Moça, do Brigadeiro e da Moeda, e que está parada na Comissão de Constituição e Justiça.
Para a deputada Bella Gonçalves, o projeto é perigoso porque abre espaço para que a área de preservação seja reduzida por lei, de uma forma juridicamente mais consolidada do que os Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) firmados com o Ministério Público, um instrumento que as mineradoras costumam lançar mão para regularizar explorações iniciadas clandestinamente.
Ambientalista diz que a invasão da área de preservação já ocorreu
De acordo com o ambientalista Cléverson Ulisses Vidigal, da organização não governamental (ONG) Abrace a Serra da Moeda, a Gerdau já manifestou a intenção de desafetar 128 mil metros quadrados no Monumento Natural Serra da Moeda.
Isso permitiria a ampliação da mina Várzea do Lopes.
Cleverson Vidigal relata que o desbarrancamento da vertente da Serra já invadiu alguns metros da área de preservação, fato confirmado pelo desaparecimento do Marco 32 do Monumento Natural.
O marco foi retirado durante obras de contenção realizadas em 2017 pela Gerdau, dentro dos limites de preservação.
Além disso, Vidigal afirmou que, dos 62 hectares que estariam sendo anexados ao Monumento Natural pelo PL 1.185/23.
Segundo ele, 31 hectares correspondem a um corredor ecológico que já está entre os compromissos de compensação ambiental assumidos pela Gerdau em 2009.
Na mesma ocasião, argumenta ele, a empresa firmou o compromisso de não mais solicitar ampliações da área explorada na Serra da Moeda.
“E ela não está cumprindo isso”, afirmou o ambientalista.
Vidigal também criticou o Governo do Estado pela demora em implantar no local um sistema de monitoramento por câmeras térmicas.
Elas são idênticas àquelas que já existem na Serra do Rola Moça.
Segurança e preservação hídrica
Segundo informações do gerente do monumento natural Serra da Moeda, Henri Collet, que é funcionário do Instituto Estadual de Florestas, a instalação das câmeras depende da Polícia Militar, que ficou responsável pela aquisição de rádios e da frequência de comunicação entre os equipamentos.
Esse processo está parado desde 2019.
A instalação das câmeras, segundo Vidigal, seria útil também para monitorar outros problemas da área de preservação, tais como vandalismo, incêndios e danos causados por praticantes de motocross.
Enquanto parlamentares e ecologistas se preocupam com a possibilidade de ampliação da mineração, há moradores de Moeda que dizem já serem prejudicados pela Gerdau.
Um deles é Gerber do Carmo, que opera moinhos de fubá criados por sua família em 1972.
Em 2013, os moinhos pararam de funcionar em decorrência da perda de vazão do Córrego Vieiras. “Deixei de produzir mil quilos de fubá por mês”, afirmou Gerber.
Cléverson Vidigal acrescentou que, em 2013, talvez não por coincidência, a Gerdau conseguiu autorização para ampliar sua produção de minério de ferro de 1,3 milhão de toneladas por ano para 13 milhões.
Ele acrescentou que a empresa tem autorização para extrair 630 mil litros de água por hora do lençol freático, para utilização na mina.
“O Córrego Vieiras perdeu pelo menos 80% de sua vazão e há outras sete nascentes que dependem da preservação da Serra da Moeda e abastecem o Rio Paraopeba, uma das fontes de abastecimento da capital”, disse Vidigal.
Essa perda de recursos hídricos também ameaça outras atividades em Moeda, segundo Sol Bueno, integrante do Coletivo Cauê e do Instituto Aqua XXI.
Ela citou produtores de cerveja artesanal, queijo, iogurte, apicultores e criadores de gado, além de raizeiros e integrantes de quilombos.
“Não é verdade que a população de Moeda seja a favor da mineração, eu diria que apenas uns 15% pensam assim”, afirmou o vereador Ednei Antunes Amorim, que também acompanhou a visita.
A maioria quer a preservação da Serra, garante o edil
Fonte: Almg
Foto: Wilson Dias