Produtores de doces de Minas podem usar tachos de cobre

Informação foi confirmada pela Vigilância Sanitária estadual durante audiência e surpreendeu doceiros e autoridades.

Utilização do tradicional utensílio sofreu reveses, mas equipamento foi redimido por nova norma sanitária. Foto: Laís Stefani
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Os tradicionais tachos de cobre usados na produção de doces em Minas Gerais estão liberados. A informação foi confirmada pela Vigilância Sanitária estadual (Visa) durante audiência da Comissão Extraordinária de Turismo e Gastronomia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta terça-feira (3/5/22). A regra está em vigor há exato um ano, mas ainda assim, surpreendeu produtores e autoridades.
A Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 20, de 2007, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) restringiu o uso do tacho de cobre, exigindo revestimento de outros materiais, entre os quais ouro ou prata

A alegação é de que o cobre é transferido para o alimento, com riscos para a saúde. A medida gerou grande impacto no setor, levando a casos até de depressão de doceiras tradicionais, conforme relatos na audiência.

Ângela Vieira reiterou a possibilidade do uso dos tachos de cobre 

Ângela Vieira, diretora de Vigilância em Alimentos e Vigilância Ambiental da Secretaria de Estado de Saúde, explicou, porém, que a norma foi modificada. A RDC 498, de 2021, vigente desde 3 de maio de 2021, permite o uso de equipamentos de cobre sem revestimento, a critério da autoridade sanitária competente, sempre que se demonstre sua função tecnológica de uso.

Segundo ela, a autoridade competente é a vigilância sanitária municipal, com apoio da Visa estadual. A diretora frisou a necessidade de boas práticas, como a higiene correta do tacho, mas reforçou que a Emater tem trabalhado nessa orientação.

Tachos de cobre foram usados para decorar o Auditório, em referência o equipamento tradicional usado na fabricação dos doces.

O deputado Mauro Tramonte (Republicanos), presidente da comissão e autor da solicitação para o debate, apresentou requerimento, a ser votado em outra reunião, para que a Anvisa divulgue a alteração na norma. “A Anvisa editou novo texto, em vez de revogar o existente”, justificou, comemorando a mudança. Produtores também pediram divulgação do tema.
Especialista defende o cobre
Se o uso do cobre depende da demonstração de sua função tecnológica, a audiência trouxe subsídios para isso. Amazile Biagioni Maia, engenheira química, mestre em Alimentos e doutora em Bioquímica, fez a defesa técnica do produto, que classificou como “insubstituível”. Entre as propriedades do cobre, ela listou a eficácia contra a proliferação de vírus, bactérias, fungos e algas.

Amazile Maia enumerou os benefícios do cobre para a produção de doces. Foto: Sarah Torres –

Uma das principais características do metal, segundo Amazile, é a alta condutividade térmica, cinco vezes maior que o ferro e 20 vezes maior que o aço. “O aquecimento inativa enzimas, o que deixa o doce com mais frescor. Também evita a oxidação que gera perda de aroma, sabor e cor. No caso dos doces de frutas verdes, como o figo, o cobre ainda estabiliza a cor (clorofila).

Com base na literatura internacional, Amazile também apontou que o cobre não tem efeito cumulativo no organismo, que absorve o necessário e dispensa o excedente. Os casos de intolerância, segundo ela, são distúrbios genéticos raros. “O cobre é ingrediente em alimentos aprovado pela FDA”, reiterou, citando a agência americana que controla alimentos e medicamentos.
Ainda segundo a doutora em Bioquímica, o índice preconizado de cobre é de 1 mg/dia, mas a FDA isenta de risco até dez vezes esse valor. Ela aponta, por fim, que os doces em geral não atingem esse limite diário inicial. O deputado Gustavo Mitre (PSB) reforçou a necessidade de valorizar e incentivar o uso do cobre.

Valorização
Produtores também reivindicaram, na audiência, a valorização da produção artesanal de doces, a simplificação e unificação de normas. Edson Wander Puiati, coordenador da Frente da Gastronomia Mineira, destacou que o produtor vive uma dicotomia entre as políticas públicas, que o incentivam, e a legislação, que o coíbe.
Delegado Heli Grilo (União) também defendeu a valorização dos produtos artesanais mineiros e a facilitação do comércio deles. “Além da questão cultural, esses produtores geram emprego e renda”, reforçou. Mauro Tramonte acrescentou que é desejo de todo viajante que passa por Minas levar um doce.

A secretária-adjunta de Cultura e Turismo, Milena Andrade Pedrosa, destacou que o Executivo tem um plano de desenvolvimento da cozinha mineira com mais de 70 ações, sendo uma delas o inventário dessa cozinha, da qual os doces são parte essencial. “Temos que resguardar saberes, fazeres e sabores. Para ser original, basta voltar às origens”, defendeu.

Segundo ela, pesquisa realizada em 2017 aponta que 30% dos turistas justificam a vinda a Minas pela cozinha do Estado, e 40%, pela cultura. Além disso, 12% das empresas mineiras têm alguma relação com o turismo, setor que responde por 8% da geração de emprego e renda no Estado. “É importante para o desenvolvimento social do Estado”, reforçou.

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